Nas últimas semanas tem sido difícil se esquivar dos noticiários sobre a “eclosão de uma guerra” entre Hamas e Israel. No dia 7 de outubro, o Hamas, organização islâmica que governa a região de Gaza, realizou ação militar em regiões do Estado de Israel e em regiões ocupadas por Israel, o que foi chamado pela imprensa internacional e brasileira de ataque surpresa. Desde então, informação, desinformação e manipulação têm sido produzidas e reproduzidas pelo chamado sistema de mídia, cujo centro irradiador é composto por oligopólios como CNN, Reuters, Fox News e Times, retransmitidas no Brasil por monopólios como Sistema Globo, SBT e Folha de São Paulo e Estado.
Para aclarar a forma como o conflito tem sido tratado e repassado à opinião pública, é necessário realizar uma recuperação histórica.
A chamada Palestina (território de 26.000 km²) era uma região habitada por aproximadamente 82% de palestinos e 18% de judeus até o início do século XX. Em junho de 1922, a Liga das Nações aprovou o Mandato Britânico da Palestina, estabelecendo a responsabilidade britânica sobre o território que anteriormente integrava o Império Turco-Otomano (derrotado e desagregado ao término da Primeira Guerra Mundial) e prevendo convertê-lo no “lar nacional” para o povo judeu. A partir de então e sob forte influência da ideologia conhecida como sionismo – palavra que vem de Sião, um dos nomes bíblicos de Jerusalém, e expressa uma ideologia nacionalista judaica surgida no século XIX na Europa, que propunha a criação de um Estado judeu na Palestina como forma de acabar com a perseguição ao povo judeu na Europa, sempre exposto aos recorrentes pogroms (massacres) –, teve curso um processo de aceleração de imigração de judeus para a região. Para além da promoção de uma progressiva recomposição demográfica, foi desencadeado o início de conflitos pela disputa do território, pela expulsão de parte da população palestina e pela subjugação de outra parte dessa mesma população pelo Estado judeu como árabe israelense sob apartheid social e político.
Assim, em 1948, após o holocausto promovido no contexto da Segunda Guerra Mundial e o antissemitismo que o antecedeu e sob radicalização sionista, foi criado Estado judeu na Palestina. Agora, para além de pretensamente acabar com a perseguição ao povo judeu mediante a criação do “lar nacional”, Estados Unidos e Europa promoviam uma espécie de “reparação histórica”.
A proposta da ONU consistia na criação de dois Estados naquele território. No entanto, o Estado palestino nunca chegou a ser criado de fato. As terras mais férteis da Palestina foram entregues aos judeus, o que explica a confusa divisão do território na região. Chamados de colonos, os judeus vieram em sua maioria da Europa e dos Estados Unidos para literalmente colonizar a Palestina, com o apoio da ONU e o respaldo militar dos Estados Unidos e da Inglaterra.
Conforme apontado, desde antes da criação do Estado de Israel, os conflitos foram constantes com o povo palestino. Já em 1947-48 ocorreu o levante chamado Al Nakba (A Catástrofe), quando 65% da população (ou 1,3 milhões de pessoas) da Região da Palestina, constituída de palestinos, tiveram seus territórios reduzidos a 44,23% (11.500 km²) da Palestina, ficando, inclusive, com as piores terras; em contrapartida, 35% da população (ou 700 mil) dessa Região, formada por judeus, ficaram com 54,77% (14.500 km²) do território, reunindo as melhores terras. Então, foi edificado o território do Estado de Israel, mas não foi criado o Estado da Palestina, e imediatamente foram expulsas 700 mil palestinos e foi acelerada a imigração de judeus europeus e norte-americanos para Israel.
Gradativamente, o território do Estado de Israel foi sendo ampliado à custa do território que deveria dar lugar ao Estado da Palestina e, à vista disso, estima-se que, atualmente, algo como 6% (1.560 km²) da Região da Palestina estejam efetivamente sob controle dos palestinos.
Portanto, embora no mundo das aparências o conflito se apresente como de fundamento religioso, é em essência uma disputa territorial e de resistência a um apartheid social e político. Disputa que não envolve apenas judeus e palestinos, mas também interesses geopolíticos de superpotências (Estados Unidos, Inglaterra) na Região da Palestina e no Oriente Médio como um todo, como o controle de regiões produtoras de petróleo/gás e de rotas comerciais.
Esses conflitos foram marcados por incontáveis ataques de Israel, chegando ao ponto de a ONU, a Human Rights Watch e outras organizações de defesa dos direitos humanos declararem que o Estado de Israel é um Estado de apartheid e que Gaza é a maior prisão a céu aberto do mundo. Isso se deve ao fato de os palestinos serem considerados pela legislação israelense como de segunda categoria e inferiores etnicamente, com limitações de participação política e de outros direitos fundamentais.
A ONG Adalah enumera 65 leis segregatórias contra o povo palestino, entre as quais, a título de exemplo, mencionam-se estas: a proibição, em 2003, de palestinos obterem cidadania israelense e de permanecerem ou transitarem no Estado de Israel; a lei de terras, que deixa sob controle do Estado israelense cerca de 94% (24.440 km²) das terras em Israel, dando a ele o poder de escolher quem pode ocupá-las e respaldando a contínua criação de colônias judaicas em território que deveria compor (o não criado) Estado da Palestina; ou ainda a lei do Estado-Nação, que define Israel como um Estado-Nação judeu. Todas essas leis concorrem para que a maioria dos palestinos, que habitam o território constituído formalmente pelo Estado de Israel, não obtenham a condição de cidadãos israelenses plenos de direitos, ficando impossibilitados inclusive de lutar por mudanças institucionais.
As perseguições ao povo palestino se intensificaram desde o não cumprimento dos Acordos de Oslo (1993) e a reação palestina que redundaria na Intifada de 2000. Desde então, uma estrema direita sionista passou a predominar politicamente em Israel, com Benjamin Netanyahu polarizando politicamente forças de extrema direita laica e fundamentalista, com destaque para a eleição de 2009. Desde então, Netanyahu ocupa o cargo de Primeiro Ministro, tendo sido reeleito em 2022.
O recente ataque realizado pelo Hamas não está descontextualizado dessa recuperação histórica, tendo sido uma retaliação, razão pela qual foi chamado de “Tempestade Al Aqsa” em alusão aos ataques realizados por Israel, em 2021, na mesquita de Al Aqsa (terceiro local sagrado mais importante do islamismo) durante o Ramadã, um dos pilares do islã. Durante esse ataque, cerca de 250 pessoas foram mortas – das quais pelo menos 230 eram palestinas, incluindo 66 crianças – e cerca de 2 mil ficaram feridas.
O Sintef-GO considera justa e necessária a luta dos palestinos pelo seu território e sua soberania, bem como apoia a luta contra o apartheid social e político imposto pelo Estado de Israel e por grande parte da sociedade israelense. No entanto, é preciso demarcar os palestinos das ações terroristas, bem como é preciso reconhecer a diversidade e a multiplicidade política presentes entre os judeus e resistir a qualquer generalização estabelecida entre o Estado de Israel e os judeus como totalidade. Embora sejam recorrentes os ataques do Estado de Israel e de civis israelenses contra palestinos, nem todos os judeus são sionistas, racistas ou advogam Estado e sociedade fundado em um apartheid. Ao contrário disso, fazem importante oposição ao governo de extrema direita de Netanyahu e ao sionismo, dentro e fora de Israel, o qual foi acusado pelo jornal Haaretz de ser o maior responsável pelo conflito em curso, inclusive com financiamento ao Hamas (à frente da Faixa de Gaza), para fazer oposição ao Fatah (à frente do governo da Cisjordana), com o propósito de dividir a resistência palestina.
Diante disso, o Sintef-GO vem declarar seu apoio integral ao povo palestino, que tem sofrido um lento e contínuo genocídio e supressão do seu território desde a criação do Estado de Israel. Também vem repudiar – denunciando como crimes contra a humanidade – os ataques genocidas que Israel promove via bombardeios a mais de 40 mil edificações, hospitais, escolas, universidades, campos de refugiados, e os assassinatos programados e sistematicamente conduzidos contra crianças, médicos, jornalistas e funcionários da ONU, com aproximadamente 12 mil mortes e dezenas de milhares de sequelados e de traumatizados desde 7 de novembro, bem como a interrupção de fornecimento de alimentos, água, eletricidade, combustível, anestesias e remédios.
O Sintef-GO apóia a interrupção imediata das operações militares criminosas de Israel e o estabelecimento de um tribunal internacional para apuração dos crimes cometidos. Defende a criação do Estado da Palestina como solução política fundamental para a resolução desse conflito, que se arrasta desde de 1948, mas com a compreensão de que esta conquista somente será possível em contexto marcado pela derrocada, na região, da presença imperialista euro-americana, do neocolonialismo, do genocídio, da hegemonia sionista no Estado de Israel e na sociedade israelense, do apartheid social e político, e da intolerância religiosa.
O Sintef-GO também vem manifestar apoio à parcela do povo judeu (residente ou não em Israel) que resiste a coalizão ultraconservadora-reacionária liderada por Netanyahu e pela extrema direita sionista (laica e fundamentalista), pois defendem a criação do Estado da Palestina, o respeito á diversidade/multiplicidade étnico-cultural e o ecumenismo religioso.
Sintef-GO,
Na Luta!