Mulheres do MST ocupam Ministério da Agricultura em Brasília

Via Brasil de Fato

Por Marina Duarte de Souza e Sheila Oliveira

Na manhã desta segunda-feira (9), as mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocuparam o Ministério da Agricultura em Brasília. A mobilização conta com a participação de 3500 trabalhadoras  de 24 estados e integra a Jornada Nacional de Lutas das Mulheres Sem Terra.

“Enfurecidas, em luta, em defesa dos nossos territórios. da nossa biodiversidade, dos direitos conquistados pela classe trabalhadora, denunciamos a aliança mortífera e destrutiva entre o governo Bolsonaro e o capital internacional imperialista que tem produzido violência”, gritaram as mulheres sem terra ao ocuparem o prédio na Esplanada dos Ministérios.

“O objetivo dessa ação de ocupação  é denunciar o projeto de morte que está por trás desse órgão federal. Hoje o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária] está subordinado ao Ministério da Agricultura e este ministério é o maior responsável pelo envenenamento de toda a população brasileira. Os agrotóxicos estão sendo jogados na mesa do povo e nós viemos aqui denunciar isso”, explica Kelly Mafort da coordenação nacional do MST. Segundo o Ministério da Agricultura, foram liberados 474 agrotóxicos em 2019, a maior liberação dos últimos 15 anos.

Jornada de Março das mulheres

O ato de ocupação do Mapa marcou o encerramento do Encontro Nacional de Mulheres do MST, realizado em Brasília desde quinta-feira (5).

“Nós debatemos as nossas pautas da terra, o nosso feminismo camponês e popular, trocamos experiências, conhecemos essa diversidade do país e terminamos da melhor forma possível com essa bonita luta das mulheres sem terra, que dá um recado para sociedade, de que nós temos que enfrentar esse governo e desgastar esta política, que é uma política de morte, nós somos em defesa da vida e é esse recado que nós viemos aqui dar hoje”, destaca Mafort.

Atiliana Bruneto, coordenadora nacional do setor de gênero do MST destaca que a mobilização das mulheres sem terra é fruto de um processo de organização realizado nos últimos cinco anos.

“Já fazem cinco anos que as companheiras e nós mesmas estamos crescendo nesse processo de organização, de luta nessa perspectiva de pautar a questão de mulher, de pautar essa questão a violência contra as mulheres. O MST não está fora dessa sociedade, tem o estigma da sociedade capitalista. Então pra dentro nós queremos dizer basta. Quiça o dia em que nós mulheres sem terra digamos que nos nossos territórios não há violência contra as mulheres. Isso a gente tem muita vontade de dizer. Nessa perspectiva a gente vai fazer nossa luta pra que a gente garanta o respeito, a igualdade e a solidariedade com as mulheres e com a população em geral”, destaca Bruneto.

Reforma Agrária

O protesto em Brasília tem como foco também denunciar o desmonte da política de Reforma Agrária no país.

“Jair Bolsonaro trabalha contra os sem terra e a serviço dos latifundiários. A medida provisória 910 quer entregar mais de 70 milhões de hectares de terras públicas da União para empresas do agronegócio e do latifúndio”, explica Mafort.

A coordenadora nacional do MST afirma que as políticas de reforma agrária “foram esfaceladas” por medidas como o decreto nº 10.252 que enxuga a estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

 O decreto extingue o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), o programa Terra Sol e outros programas que davam incentivos aos assentados, quilombolas e comunidades extrativistas.

“Jair Bolsonaro não quer que o povo do campo estude, não quer que o povo tenha terra e é isso que nós viemos denunciar. Pra nós a ação foi muito positiva, nós demos nosso recado, ocupamos, deixamos nossa simbologia e agora estamos retornando pros nossos estados”, ressalta Mafort.

Em nota o MST afirma que o governo Bolsonaro “está determinado a privatizar as terras e promover a devastação ambiental”.

“Um exemplo é a MP 901/19 que, na prática, irá excluir da proteção ambiental de 4.745 hectares da flora nos estados do Amapá e Roraima e abrir estas áreas para a mineração. Já a chamada MP da Grilagem (MP 910/19) flexibiliza as regras de regularização fundiária, repassando áreas da União até 2.500 hectares ao valor irrisório de 10% sobre a terra nua à invasores ilegais, que se valeram do crime de grilagem para se abonar destas terras”, aponta o MST”, diz o texto distribuído à imprensa.

Agricultura familiar e segurança alimentar

O MST também aponta que as políticas do atual governo afetam diretamente a alimentação da população brasileira por meio do abandono de programas voltados para a agricultura familiar e a segurança alimentar e nutricional, como é o caso do  Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). No ano passado, o valor executado pelo PAA com recursos do Ministério da Cidadania foi de R$ 188 milhões. Para o período que se inicia a previsão é de R$ 101 milhões.

“Apesar dos esforços do atual governo para ocultar o fracasso na economia, os brasileiros sentem na pele a queda dos investimentos públicos, que chegaram a ultrapassar R$ 66 bilhões entre 2012 e 2014 e agora, em 2020, tem previsões de ser abaixo de R$ 20 bilhões. Nesse contexto, o desemprego multiplica o número de pessoas desalentadas, sem teto e sem alimentos”, informa o MST por meio de nota enviada à imprensa.

Atiliana Bruneto, da coordenação nacional de gênero do MST, ressalta que a alimentação saudável é uma pauta não apenas dos sem terra mas de toda a sociedade.

“Nós definimos esse ano de que nós vamos fazer a luta para desmontar e desmoralizar esse governo que tem feito ataques violentos às populações mais pobres. Por exemplo a demarcação das terras indígenas ele parou, a reforma agrária com várias medidas que inviabiliza. Por isso a gente foi no Mapa, porque é uma pauta nossa, mas quem come alimento saudável é a sociedade. Então também é uma pauta que envolve meio urbano e meio rural”, afirma Bruneto.

Titularidades individuais

Durante a ação, as trabalhadoras denunciam a realização de uma distribuição de titularidades individuais dos lotes de terra para os assentados de reforma agrária, a chamada titularização das terras, que classificam como privatização das áreas. Na pauta do protesto também estão os cortes nos investimentos públicos e a liberação desenfreada de agrotóxicos pelo governo Bolsonaro.


Mulheres do MST em frente ao Ministério da Agricultura em Brasília / Foto: Marina Duarte / Brasil de Fato

Sobre distribuição de titularidades individuais dos lotes de terra para os assentados, de maneira prática, a ação regulariza a venda de lotes da Reforma Agrária e passa ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a responsabilidade sobre áreas coletivas dos assentamentos, onde estão escolas e centros de formação organizados pelo MST.


A ação visa denunciar as políticas do governo Bolsonaro em relação à economia, terra e agricultura / Comunicação MST

Procuradoria solicita  esclarecimentos sobre Pronera

Na última sexta-feira (6), a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) solicitou ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) informações quanto às providências que estão sendo adotadas para garantir recursos humanos, organizacionais e orçamentários para a gestão do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera).

No documento à ministra Tereza Cristina, a PFDC aponta que há na atualidade enorme insegurança quanto ao espaço administrativo responsável pela gestão do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária e ressalta que, na vigência do Decreto 9.667 – publicado em 2 de janeiro de 2019 e revogado pelo Decreto 10.253, de 20 de fevereiro de 2020 –, ficou sob a responsabilidade do Ministério “promover a educação no campo aplicada ao desenvolvimento da agricultura familiar”.

“Nos termos do artigo 214 da Constituição Federal, a educação deve se organizar sob a forma de planos decenais exatamente para garantir planejamento – e o consequente aporte dos recursos humanos, organizacionais e orçamentários – e impedir descontinuidades”, destaca o documento, que é assinado pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.

Educação no campo

O Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária é uma política pública de Estado, desenvolvida de maneira ininterrupta desde 1998 e atualmente consolidada pela Lei 11.947/2009. A iniciativa busca a democratização do acesso à educação, por intermédio de alfabetização e escolarização de jovens e adultos, bem como a formação de educadores para as escolas do campo, e a formação técnico-profissional de nível médio, superior, residência agrária e pós-graduação latu sensu e stricto sensu.

Somente entre 1998 a 2011, o Pronera atendeu mais de 164 mil educandos oriundos de assentamentos rurais. Dados da II Pesquisa Nacional sobre a Educação na Reforma Agrária, produzido em 2015 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam que o Programa promoveu 320 cursos, por meio de 82 instituições de ensino localizadas em 880 municípios, em todas as unidades da federação.

Atenção: este texto é uma republicação do site Brasil de Fato e faz parte da semana de divulgação das lutas das mulheres no Brasil.

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